A perda do poder familiar, a criança e a adoção

A perda do poder familiar, a criança e a adoção

Christiane Bôa Viagem, jornalista

A perda ou destituição do poder familiar é uma medida jurídica excepcional. Esta decisão retira dos pais os direitos e deveres em relação aos filhos menores de idade em casos de abuso ou exploração sexual, abandono, negligência, atos contrários à moral e aos bons costumes, conduta imprópria ou, ainda, em situação de descumprimento injustificado dos deveres inerentes ao poder familiar.

Na legislação brasileira, há um conjunto de leis que regula a destituição do poder familiar: a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227; o Código de Processo Civil, lei no. 10.406 de 2002; o Estatuto da Criança e do Adolescente, lei no. 8069 de 1990, e o Marco Legal da Primeira Infância, lei no. 13.257 de 2016. Segundo o documento “Destituição do Poder Familiar e Adoção de Crianças” do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é preciso levar em consideração problemas sociais e dificuldade de acesso a direitos básicos como acontece no Brasil. O documento afirma: “crianças identificadas em uma situação de abandono e violência não necessariamente são vítimas de maus tratos de sua família de origem, uma vez que toda a família pode se encontrar em uma situação de extrema vulnerabilidade social devendo, assim, ser protegida como um todo.” Desta forma, em situações como essa, busca-se primeiramente acolher a família com apoio e orientações como recebimento de benefícios, assistência social e psicológica oferecidos pelo poder público.

O início do processo de perda do poder familiar se dá por parte do Ministério Público, Conselho Tutelar ou por alguém que tenha conhecimento dos fatos que justifiquem a medida. Antes da destituição, há diversas tentativas de manter as crianças com os pais. A Justiça estende seus esforços para os parentes próximos como avós e tios, incentivando-os a acolher as crianças. Caso não haja sucesso, as crianças são encaminhadas para abrigos até a conclusão do processo. Por fim, o juiz realiza audiência de instrução e julgamento em que serão ouvidos os pais, os filhos, testemunhas e peritos, como um psicólogo, para avaliar as circunstâncias do caso e verificar se a medida é realmente necessária.

Há diversas variáveis que levam a celeridade no processo de perda do poder familiar. Segundo o documento do CNJ, “a distribuição de tempo decorrido em anos nos diferentes momentos de um processo de adoção é distinta para as faixas etárias. Há uma tendência de as faixas etárias mais jovens terem um tempo de adoção menor”. Observando a partir da etnia/cor das crianças, o tempo mediano entre afastamento dos pais e a sentença de adoção dura em média um ano para crianças brancas e mais de um ano para crianças pretas e pardas.

Os dados do Sistema Nacional de Acolhimento e Adoção (SNA) do CNJ informam que são 32.824 crianças e adolescentes acolhidas no Brasil, dentre elas 46,9% estão na primeira infância e 64,95% são pretas ou pardas. No entanto, apenas 4.454 estão aptas para adoção, ou seja, a maioria ainda está com o processo de destituição do poder familiar em andamento. Os dados do SNA também apresentam o número de pretendentes a adoção que são pouco mais de 35 mil. Pelo estudo citado do CNJ, “observa-se uma diferença significativa entre o interesse dos pretendentes segundo a idade da criança que estão de fato aptas para adoção e a idade de crianças aptas para adoção”. Por isso a conta não fecha: as crianças aptas para adoção não fazem parte do perfil dos pretendentes, assim, permanecem abrigadas.

Para estimular a adoção tardia, de crianças maiores e de adolescentes, vários Tribunais pelo país realizam campanhas de incentivo a adoção. Além disso, há também campanhas de busca ativa, principalmente, para grupo de irmãos e de adolescentes.

Assim, observa-se que a perda do poder familiar não necessariamente leva uma criança a adoção. Há uma série de variáveis que compõem essa equação que precisam alcançar interseções que levem pretendentes a efetivar a adoção. É preciso a atenção da sociedade para que esses meninos e meninas abrigados sejam o mais bem acolhidos possível e encaminhados com todo apoio necessário para uma vida digna em sua maior idade.

Referências:

Destituição do Poder Familiar: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/destituicao-do-poder-familiar-o-que-e-e-como-funciona/1793533751

Destituição do Poder Familiar e a Adoção de Crianças: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/04/eixo3-primeira-infancia-sumario-executivo-final.pdf

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